Lourenço corta, estica e lima as linhas do motor
Mecânica de competição com pormenores e subtileza
Da assistência em ralis à especialização dos Datsun faz-se a carreira de mais de 30 anos de Lourenço, mecânico de competição. Uma vida dedicada ao pormenor, a combinar peças de motor com paciência e exactidão que escapa aos mecânicos de produção em série; com a paciência que já lhe permitiu construir dois carros de raiz, só com peças de sucata.

Lourenço é o pseudónimo de José Gomes, o “nome de guerra” de um mecânico que sempre trabalhou com carros, desde os nove anos e que começou na competição com apenas catorze. Nessa altura era ainda o Lourencinho, nome que pegou porque andava muito com o pai Lourenço e marceneiro. “Uma ascensão muito rápida”, como sublinha, de uma carreira que começou por brincadeira quando uns amigos o convidaram a fazer assistência num rali na Cabreira, não tinha ainda quinze anos.
Os carros não têm segredos para este mecânico especializado e a trabalhar actualmente com a marca Datsun. Alguns segredos de profissão guarda-os, para já, mas promete um dia revelá-los a amigos e concorrentes, quando abandonar, talvez num website.
Mas isso são planos para um futuro mais distante. Por enquanto, Lourenço dedica-se a tirar o máximo partido daquilo que a sua experiência de 36 anos de profissão, aliada às capacidades do motor dos Datsun permite. Aliás, o modelo 1200 da marca é, na sua opinião, “um dos melhores carros feitos até à época”. Tem um motor simples, fácil de retirar e desmontar; “em hora e meia todo peça por peça”, explica. Para Lourenço, o carro só encontra paralelo no Carocha 1200 e, mesmo assim, com vantagens para o Datsun pela simplicidade e rapidez na desmontagem. O que leva mais tempo é depois voltar a montar tudo, principalmente quando se trata de um carro destinado à competição.
Prepara um carro e um motor para a competição é muito mais complicado, porque é preciso trabalhar com o que já existe e encontrar pormenores que tenham ficado esquecidos, cantos em que os mecânicos de origem não tenham mexido. É um trabalho de optimização e que requer, portanto, muita paciência, cálculos e subtileza. Com o conhecimento adquirido em 36 anos de carreira, Lourenço explica que “os fabricantes fazem um motor restrito para o carro, para poder funcionar nas melhores condições, dura o máximo de quilómetros”. “Na competição um tipo vai buscar e aplicar, cantos em que os fabricantes não actuam tanto, porque não têm cuidado, não têm tempo, nem têm necessidade”, remata. E se o trabalho já seria complicado só por si, na competição há ainda que ter em conta as regras, que não permitem grandes alterações. Os profissionais “andam a limar arestas” para garantir mais rotação e velocidade de ponta, pelo que requer muito esforço e dedicação “manter estes carros na frente”.
A dedicação de Lourenço e a sua paciência ficaram comprovadas quando, ainda em início de carreira construiu, de raiz, dois carros só com peças de sucata. Na altura, nos anos 70, fez os carros para dois pilotos que não tinham condições financeiras para adquirir peças de origem. Assim, transformou peças de outros carros num Escort RS 2000 e num Chevette, preparados para competição.
Após uma pausa de dez anos na actividade ligada à competição, Lourenço regressou exclusivamente ligados aos Datsun, na sua opinião o carro com a mecânica menos dispendiosa. Como ele mesmo refere, “são carros já com trinta anos e que se forem bem tratados podem durar outros tantos”. O único problema é a marca já não existir e haver algumas dificuldades de acesso às peças. Por enquanto, vai arranjando as peças de que necessita na Nissan, o nome actual da antiga marca Datsun, ou então na concorrência. Isto porque acredita que “se houver material, daqui a 100 anos estes carros continuam espectaculares”. Para os mais curiosos, Lourenço, ou melhor, José Gomes, promete: “Um dia, se eu me desligar dos Datsun, terei todo o gosto em fazer um site na Internet sobre o motor dos Datsun onde explique os meus truques: onde eu corto, onde estico, onde lixo e acerto e terei todo o prazer em mostrar aos meus amigos e concorrentes o porquê de os meus carros andarem muito”.